4.5.12

Maio. Da chuva.



A chuva. Um rumor antigo despenhando-se cegamente na pedra lisa dos parapeitos, rasgando sulcos na terra fecunda dos canteiros, abrindo pequenos golpes nos vidros - feridas que sarariam logo depois, na confusão umas das outras. Quem teria inventado o Inverno, os dias curtos que o amor não tinha tempo de visitar, os lençóis frios quando o corpo se virava na cama, desprevenido? Podia morrer-se a pensar nisso, a olhar os nós crescendo nos dedos como efermidades sempre novas. Talvez a morte fosse isso mesmo, um imenso Inverno. Bastava que nos sentássemos quietos e deixássemos de comer, de andar, de falar, que fixássemos as mãos e ouvíssemos o ruído da chuva como um aviso. (...)

(Maria do Rosário Pedreira, in Alguns homens, duas mulheres e eu.)

1 comment:

[sen.siˈʝes] said...

beautiful.
somehow sad but beautiful.
so may unlikely. today it's also raining here.